Em fervor da vida, grito silenciosamente para me sentir a explodir em mil, sem sangrar, sem doer.... sem que ninguém veja.... sem que ninguém oiça.... apenas eu sinta a cabeça a doer de tantos gritos (sufocados... para que o mundo continue sem me ver)...
Em fervor da vida, choro... porque uma dor vem de mansinho e o coração aperta-se, as memórias despontam.... e o choroso peito abre-se em mil lágrimas de cristal... são lágrimas, sim... mas não lágrimas de dor.... são lágrimas de vida, porque toda a dor me fez ser quem sou... sem medos de me ver ao espelho, sem medo de ouvir a minha voz (mesmo que a fraquejar)... sem medos de ser....
Mónica António
Encontrei-me neste mundo certo dia, que não sei qual foi, e até ali, desde que evidentemente nascera, tinha vivido sem sentir. Se perguntei onde estava, todos me enganaram, e todos de contradiziam. Se pedi que me dissessem o que faria, todos me falaram falso, e cada um me disse uma coisa sua. Se, de não saber, parei no caminho, todos pasmaram que eu não seguisse para onde ninguém sabia o que estava, ou não voltasse para trás - eu, que desperto na encruzilhada, não sabia de onde viera. Vi que estava em cena e não sabia o papel que os outros diziam logo, sem o saberem também. Vi que estava vestido de pajem, e não me deram a rainha, culpando-me de a não ter. Vi que tinha nas mãos a mensagem que entregar, e quando lhes disse que o papel estava branco, riram-se de mim.
E ainda não sei se riram porque todos os papéis estão brancos, ou porque todas as mensagens se adivinham.
In "Livro do Desassossego" Bernardo Soares
(FERNANDO PESSOA)
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
. dias
. GOOD BYE
. GOING ON
. ...
. ...
. ...
. LUAR